Aos poucos, vários prefeitos estão se interessando em usar a TI para melhorar a gestão de municípios e a prestação de serviços à população

A tecnologia da informação tem um novo papel a cumprir no mundo. Após impulsionar o trabalho de cientistas, renovar os negócios de empresas e, recentemente, mostrar seu valor social e colaborativo, é hora de ajudar as cidades ao redor do mundo a entrarem no novo século, de uma forma moderna e conectada. Estamos ainda vivendo o embrião desse movimento que conta com boas perspectivas, mas há quem o imagine como uma renovação sem precedentes da gestão pública, com a consolidação de todas as teorias sobre sociedade da informação e até mesmo um novo aquecimento de mercado comparável ao Bug do ano 2000.

Esse fenômeno – e mesmo sua definição de espectro – ainda está indefinido. O termo mais usado é cidades digitais. Mas, há quem utilize cidades inteligentes e e-cities. A diferença está no tamanho da revolução que a tecnologia proporciona e na abrangência da estratégia do gestor público. Essencialmente, trata-se de uma comunidade capaz de se relacionar por meio de infraestrutura de banda larga confiável, com serviços inovadores aos cidadãos, que consegue equalizar desenvolvimento com educação e ainda tem agilidade para se modernizar ainda mais. Ou seja, estamos falando de uma ótima cidade para se viver nesses tempos de celulares, Internet e comunicação digitalizada.
No Brasil, o movimento de cidades digitais é consistente, embora não se saiba quantos dos 5.564 municípios brasileiros podem ser enquadrados nessa nova onda. Existem entre 50 e 60 casos conhecidos. Acredita-se que existam ainda mais regiões capazes de entrar nessa lista. Há muitas prefeituras que se entusiasmaram com o conceito e estão procurando empresas que possam ajudá-las a entrar nesse novo mundo conectado.

«Estamos com 30 projetos de cidades do Piauí que querem se tornar digitais», aponta o diretor técnico da Safetway, uma revenda Motorola situada em Teresina, Reginaldo Marreiros. A maioria deve vingar nos próximos meses. Os prefeitos ficaram interessados depois que Parnaíba, situado no litoral do Estado e com 150 mil habitantes, implementou o programa de cidade digital.

O município é o segundo mais populoso do Estado e, historicamente, tem a economia dependente da extração de recursos naturais e de algumas indústrias de alimentos e perfumaria. Contudo, as belas paisagens têm elevado o interesse turístico na região, e a presença de uma universidade estadual, uma federal e várias faculdades tem transformado a cidade em pólo educacional. Assim, com a economia em transformação, o município precisou se modernizar.

O primeiro passo da digitalização de Parnaíba foi a implementação de uma infraestrutura de banda larga wireless para interligar os prédios públicos, serviços de atendimento e sistemas de saúde e segurança. Após a finalização desse processo, mais de 100 escolas receberam conexão à internet, para uso dos alunos em sala de aula e também para o aperfeiçoamento dos professores e a melhora na troca de dados entre os órgãos educacionais. «Tivemos de montar uma estrutura sem fio porque não havia banda larga cabeada confiável, o único serviço existente fornecia apenas 300Kbps», explica Marreiros.

O projeto foi realizado com plataforma de banda larga sem fio da Motorola, que criou um backbone de internet em uma área de 16 quilômetros em torno de uma torre central. A conexão foi posteriormente expandida com uma rede WLAN (Wireless Local Area Network), que utiliza portas de acesso e switches sem fio distribuídos por sete pontos remotos. Com isso, o acesso ficou garantido para a população e turistas em vários pontos, como o Aeroporto Internacional João Silva Filho, Terminal Rodoviário Interestadual, Praça de Eventos, Universidades Federal e Estadual do Piauí, Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet) e Porto das Barcas.

A segunda fase prevê a instalação de câmeras de vigilância que transmitirão as imagens para uma central da Guarda Civil Municipal. Além disso, está prevista a conexão de todo o sistema público de saúde à rede, o que favorecerá a população no agendamento de consultas e no levantamento de histórico clínico dos pacientes. O projeto também prevê o desenvolvimento de bibliotecas virtuais nas instituições de ensino, além da criação de telecentros.

Primeiros passos no mundo digital

Em geral, esse tem sido o caminho adotado por prefeituras que querem se tornar cidades digitais. «Antes de tudo, elas querem uma banda larga confiável para interligar as entidades operacionais públicas e melhorar a troca de informações e a gestão», destaca o gerente da área de Governo e Empresas da Motorola, Joeval Martins.

Posteriormente, ganham prioridade os planos de inclusão digital e melhoria do sistema educacional. Em uma terceira etapa, começam a surgir novos serviços à população. Tudo isso dentro de um ambiente digital. «Com o tempo, os prefeitos entendem que a rede é apenas um meio e começam a inovar», diz Martins.

O projeto de Parnaíba foi inspirado pelo pioneirismo de Macaé (RJ), considerada por muitos a cidade mais digitalizada do Brasil. Neste município carioca, que tem se desenvolvido devido à indústria do petróleo e possui cerca de 200 mil habitantes, o caminho da modernização digital começou com a interligação de 27 prédios da municipalidade por meio de uma rede sem fio WiMesh.

A ampliação do projeto alcançou os postos e a Secretaria de Saúde, bem como cinco praças da região e distritos vizinhos. A rede sem fio de alta velocidade gerou inovações impensáveis anteriormente. O município conta atualmente com uma espécie de telemedicina no sistema de saúde. «Por meio de um celular com câmera, um agente de saúde pode mandar uma imagem de um paciente para que um médico avalie a situação remotamente», explica o diretor da revenda Jevin, Guilherme Cunha, que implementou o projeto na cidade.

Nos últimos meses, Macaé tem implantado o Ofício Digital. O software desenvolvido pela Secretaria de Ciência e Tecnologia é utilizado por 395 usuários espalhados por 146 unidades administrativas. O sistema auxilia na criação e no envio de documentos oficiais, além de facilitar a recuperação desses dados.

Mas, as cidades digitais podem chegar ainda mais longe. Em Cingapura, um sistema inteligente de previsão de tráfego é utilizado para priorizar o uso de transporte coletivo e melhorar o trânsito em horários de pico. Sensores e câmeras se comunicam com um software que controla a abertura de semáforos e facilita a passagem das vias que possuem mais ônibus e estão mais carregadas. Os cidadãos contam ainda com um bilhete que permite utilizar estacionamentos, trens, ônibus e taxis. Os dados são gerenciados pelo governo.

Em Malta, um pequeno arquipélago no Mediterrâneo, sensores e softwares ajudam o governo a economizar energia. O país possui diversas fontes energéticas e, de acordo com a demanda, o sistema direciona o consumo para que a prioridade seja dada para as alternativas mais limpas e sustentáveis. A tecnologia também evita apagões, usando a inteligência digital para evitar cortes repentinos por excesso de carga.

Um mundo a ser explorado

Ambos os projetos têm o dedo da IBM, que também aposta no crescimento desse mercado. No Brasil, a gigante de tecnologia está conversando com várias cidades que serão sedes da Copa do Mundo de futebol de 2014 e que já preveem a necessidade de infraestrutura de banda larga total e controles mais eficientes na administração com o fluxo de turistas e o desenvolvimento econômico propiciados pelo evento. «Os problemas atuais das cidades não serão resolvidos sem tecnologia e os prefeitos começam a perceber isso», aponta o diretor de cidades inteligentes na IBM, Pedro Almeida.

Para ele, essa onda abre várias oportunidades para o mercado de tecnologia, que anda desconfiado quanto à estagnação do segmento corporativo. «Há espaço para a venda de hardware, conexão, softwares e serviços, exatamente como já ocorreu anteriormente com as empresas», diz. Para a IBM, a expectativa é de um novo boom comercial, embora não se saiba se o comportamento será idêntico à demanda no Bug do milênio ou um pouco mais esparso, devido à falta de cultura no uso de tecnologias por gestores públicos e ao excesso de burocracia que costuma interferir nos negócios com governos.

Se a velocidade das compras é desconhecida, por outro lado, há certezas sobre as possibilidades de negócio. «São tecnologias já conhecidas, que estão à disposição e já são testadas e aprovadas», comenta o diretor de gestão pública do CPqD, Renato Stucchi. Para ele, a criação de cidades inteligentes tende a ser em etapas e pode demorar de 8 a 12 anos, mas há uma vantagem. «Como esse movimento está ocorrendo agora, os municípios serão pressionados ao mesmo tempo por todas as ondas de tecnologia que já foram passadas, como sistemas de gestão, Internet, celulares e redes sociais», afirma.

E o futuro é imprevisível. No começo, com infraestrutura de banda larga cabeada ou wireless, esses municípios podem mesmo serem enxergados como apenas administrações digitais. À medida que a integração aumenta, no entanto, a população começa a participar dessa evolução e uma cidade digital começa a se formar. «A criação de novas aplicações para fornecer serviços inovadores começa a mudar o perfil para cidades inteligentes e isso levará, sem dúvida, às cidades sustentáveis», prevê o diretor de desenvolvimento de novos negócios da Cisco, Rodrigo Uchôa. Todo esse desenvolvimento baseado no uso de tecnologia e na esperança que, além de cidades inteligentes, possamos contar com políticos inteligentes também.

Source: por Gilberto Pavoni J. | Especial para CRN Brasil http://www.resellerweb.com.br/noticias/index.asp?cod=68387